sexta-feira, 12 de julho de 2013

Lembram-se de Vítor Camarneiro - III


Em Novembro de 2012 dei conta do início do julgamento do chamado "caso dos CTT" de Coimbra em que Vítor Camarneiro era arguido. Do mesmo modo, no passado dia 12 de Junho, dei conta da sua absolvição. Dou agora conta de uma nota ontem recebida do próprio, que agradeço, publicada com a sua autorização.
 
 
Há precisamente um mês atrás, no passado dia 11 de Junho, pela 2.ª Vara Mista do Tribunal Judicial de Coimbra, fui ABSOLVIDO das acusações que sobre mim impendiam no âmbito do processo conhecido como CASO CTT (autor de um crime de corrupção passiva para acto ilícito, previsto no 372º, n.º 1 do Código Penal, por referência ao disposto no art.º. 386º, n.º 1, al. c) do mesmo Código, incorrendo ainda na pena acessória de proibição do exercício de funções como titular de cargo público, funcionário ou agente da administração, nos termos do art.º. 66º, n.º 1, als. a) a c) do Código Penal)…!
Cinco anos e meio após terem sido contra desencadeadas diligências públicas e privadas (buscas à sede da Associação Fernão Mendes Pinto e à minha residência, inquirições levadas a cabo pela Polícia Judiciária e consequente publicitação das suspeitas nos meios e lugares do costume), que tornaram a minha vida e da minha família num autêntico inferno e abalaram a credibilidade edificada ao longo de mais de duas décadas de trabalho enquanto dirigente de diversas organizações nacionais e internacionais…, fez-se justiça e foi reposta a verdade. A mesma verdade que alguns teimaram em não querer ver e que outros, antes meus amigos chegados e confidentes, da forma mais indigna, traiçoeira e abjecta, tudo fizeram para pôr em causa e antecipar uma culpabilidade que nunca tive nem poderia ter tido, como, aliás, acabou por provar-se.
E no entanto, a razão por que o Ministério Público, a Polícia Judiciária, a Associação Fernão Mendes Pinto e o seu presidente, ou quem quer que fosse, não mostraram estar realmente interessados no imediato apuramento da verdade, tornou mais do que questionável a sua acção, porquanto todos os documentos e provas apresentadas em Tribunal sempre estiveram em sua posse e ao seu alcance, designadamente, as actas da Direcção e da Assembleia Geral, os contratos celebrados e as contrapartidas efectivamente recebidas, já para não falar do testemunho dos demais membros dos corpos sociais e outros intervenientes directos, cujos esclarecimentos poderiam ter sido inequívocos e esclarecedores como vieram a sê-lo no decurso do julgamento.
Ou então a intenção era mesmo essa e a minha constituição como arguido serviu interesses diversos que nada tiveram a ver com o apuramento da verdade e a realização da justiça, fazendo-me recordar:
primeiro, o facto do Ministério Público nunca me ter ouvido até ao julgamento;
segundo, a frase com que a Polícia Judiciária disse ao que ia quando chegou pela primeira vez à Associação “tudo o que tiver a ver com camarneiros, socialistas e comunistas…”;
terceiro, a postura assumida pelo actual e então, recém-eleito, presidente da Associação Fernão Mendes Pinto, José Guerra (que eu próprio apoiei e propus para me suceder nas eleições de 2005), quando o confrontei com o facto de ter sido constituído arguido e julgar ser seu dever e da Associação apoiarem-me na defesa, e da sua parte ter obtido como resposta que “iria ficar a assistir”, omitindo nessa altura que havia sido o seu testemunho a colocar-me na situação em que me encontrava, como mais tarde pude comprovar quando dele tomei conhecimento e o vi repetido em tribunal;
quarto, a idêntica demarcação do consultor jurídico da Associação, Emílio Torrão, que eu próprio havia contratado no início da sua carreira, a quem sempre consultei em todas as situações que o justificaram e que considerei meu amigo até ao dia em que a Polícia Judiciária fez buscas em minha casa e ele, em vez de solidariedade e confiança, através de telefone e email, me transmitiu por outras palavras o mesmo que o José Guerra, ou seja, demarcando-se e ficando a ver no que dava o caso. Não estranhando, portanto, que mais tarde, encontrando-se o processo já em fase adiantada de julgamento, tudo tenha feito para aligeirar o perjúrio cometido pelo Guerra quando depôs como testemunha de acusação em Tribunal e omitiu e mentiu de forma deliberada perante o colectivo de juízes, que lhe valeu veemente reprimenda do Juiz Presidente encarregue de julgar o processo, cuja gravação áudio tenho em meu poder e poderei ceder a quem o desejar;
quinto, as pessoas que comigo trabalharam ao longo de anos, mas que não resistiram à tentação de agradar ao novo presidente e se deixaram enredar numa teia de mentiras e esquemas que acabaram por descredibilizar a Associação e a conduziram ao estado em que se encontra.
e por último, os predadores da Fernão Mendes Pinto Saúde SA, ou seja, aqueles que acabaram por beneficiar com a situação gerada no seio da Unidade de Saúde de Coimbra e a cumplicidade da Associação Fernão Mendes Pinto e não só, a começar pelo Pedro Garcez que anda fugido no Brasil, ao que parece associado a empresários conhecidos da nossa praça…?, e aos dois investidores a quem supostamente foram vendidas as acções, João Gonçalves e Alfredo Calvão.
O José Guerra, sei-o hoje, quis de forma deliberada denegrir a minha imagem e fazer passar a ideia de que eu havia deixado a Associação em estado de falência, tratando por essa via de esconder a sua própria incompetência e responsabilidade e valorizando o seu papel enquanto auto-apregoado salvador. Contudo, cometendo várias omissões:
a primeira, quanto ao facto de nos últimos três anos ter sido vice-presidente da Associação, responsável pela área da gestão e administração, cargo exercido a tempo inteiro e a título profissional nos derradeiros 7 a 8 meses do mandato (2003-2005), remunerado através da Fernão Mendes Pinto Saúde SA no montante de €2500,00 mensais.
a segunda, não admitindo perante mim e a sua própria direcção, que a Fernão Mendes Pinto Saúde SA havia adiantado à Associação Fernão Mendes Pinto €500000,00 a título de contrapartida por esta não acompanhar o aumento de capital social realizado em finais de 2005;
e a terceira, que a Associação, por ser detentora de todos os protocolos celebrados com o Ministério da Saúde e Hospitais no âmbito dos Cuidados Continuados, e com a Segurança Social no âmbito dos Acordos de Cooperação para Lar de Idosos, face aos contratos que eu negociara e assinara anteriormente, passara a ter direito a 2,5% de toda a facturação/receita bruta da Unidade de Saúde de Coimbra e a 50% dos lucros que viessem a verificar-se, sendo que quanto a esta última cláusula, ele próprio, sem mandato da Direcção ou Assembleia-geral, nem qualquer explicação plausível (…?!), prescindiu desse importantíssimo direito.
… mas não tendo prescindido da minha condição de avalista que continuo a ser da Associação Fernão Mendes Pinto, passados que são 8 anos desde que deixei de ser seu presidente!
O que fez à Associação a partir daí foi inqualificável:
o relatório de contas referente ao ano de 2005…, subitamente, convenientemente, apresentou resultados negativos de mais de cem mil euros, apenas para pôr em causa a gestão anterior (como se nela não tivesse tido responsabilidades), enquanto o de 2006, como por milagre e fruto da sua elevada competência passou a dar resultados positivos, apesar de, ainda assim, ter estado durante anos a pagar salários à quinzena, a dever subsídios de férias e natal e a subtrair direitos aos funcionários, proeza que em 21 anos de presidência de Direcção nunca me atrevi a fazer, já que jamais quaisquer salários ou subsídios haviam ficado por pagar;
saneou e despediu muitos dos melhores quadros técnicos, especialmente aqueles que lhe faziam frente ou lembravam a minha pessoa;
encerrou serviços e abandonou projectos sem que se percebessem os critérios adoptados;
desperdiçou um financiamento já aprovado a fundo perdido de €250000,00 para a construção de uma nova creche em Quinhendros;
desvalorizou o simbolismo das efemérides que sempre foram comemoradas pela Associação, nomeadamente, o Aniversário e as festas de Natal, apenas para evitar que eu e outros dirigentes, ex-dirigentes, associados, associados honorários, nelas participassem e ensombrassem a sua triste presença;
levou a Associação à situação de enorme apatia e mediocridade em que se encontra, extinguindo a criatividade e inovação que sempre foram as principais marcas da sua acção e que desde sempre haviam suscitado apreço e admiração dentro e fora de portas, tendo chegado ao ponto de se ter apresentado numa assembleia-geral completamente alcoolizado;
minou a democracia interna e o respeito que sempre foi conferido a todos os intervenientes (associados, funcionários, utentes, pais, clientes, cidadãos em geral), em que os estatutos sempre foram cumpridos, as reuniões de direcção, assembleias-gerais e todos os demais procedimentos obedeciam aos preceitos e disposições legais e todos tinham direito à informação, à opinião livre e ao debate, e a instituição não se encontrava refém de um presidente que só reúne os seus pares quando lhe apetece, lhes nega informação e os menospreza. Um presidente profissional que entra às 11,00 – 11,30 horas, fala da Associação na primeira pessoa do singular e passa parte do tempo a fazer tudo menos o que interessa à entidade que preside e lhe paga o salário, desbaratando o potencial daquela que já foi uma das maiores referências do associativismo nacional e europeu.
Contudo, gostaria de salvaguardar e agradecer a algumas pessoas que nunca duvidaram da minha inocência:
os ainda membros da Direcção, António José Sérvolo e José Alberto Charro, que foram minhas testemunhas de defesa e se limitaram a dizer a verdade;
o Presidente da Assembleia Geral Carlos Lucas Correia, que só não compareceu em julgamento por razões de saúde;
a minha sobrinha Sandra Maranha, também membro da Direcção, que sofreu comigo e manteve a equidistância institucional possível;
a ex-vice-presidente Rosinda Pimenta, cuja clarividência do seu testemunho, para além da amizade, quase poderia tornar-se num documento de estudo sobre a Associação;
o Fernando Nobre, ex-funcionário despedido pelo José Guerra, que fez luz sobre aspectos de gestão financeira e procedimentos que teimavam em manter-se enublados;
o associado honorário, meu amigo e grande historiador, Alfredo Pinheiro Marques, pela sua contundência e frontalidade em todos os momentos, incluindo aqueles em que me encorajou a lutar e a acreditar e foi minha testemunha abonatória;
e porque é justo fazê-lo, realçar o apoio e testemunho sentido do ex-presidente da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho José Manuel Antunes (o melhor que conheci neste concelho e o único dos que foram eleitos desde 25 de Abril de 1974 que ficará para a história);
sem esquecer, apesar de também terem sido indicados pelo Ministério Público como testemunhas de acusação, Bruno Paixão (ex-membro do CA da FMPS SA) e Fernando Andrade (ex-presidente da ARS), cujos depoimentos não permitiram dúvidas quanto à forma como defendi os interesses da Associação Fernão Mendes Pinto e, simultaneamente, da Unidade de Saúde de Coimbra que, como talvez nem todos saibam, continua a funcionar em pleno (8 anos depois de ter sido inaugurada) e a transferir para a Associação centenas de milhares de euros por ano.
e à minha família (mãe, irmãs e irmão, cunhadas e cunhados, sobrinhas e sobrinhos, ex-mulher, filhos e afilhada, compadre, outros familiares e amigos(as)), confessando que apesar de ter sido absolvido me considero culpado por tê-los feito passar o que passaram e obrigado a tolerarem alguns dos efeitos da maldição que sobre mim recaiu, não só das calúnias e boatos, nem das notícias de jornais e jornalistas que nunca quiseram escutar a minha opinião ou me permitiram exercer o direito de contraditório, mas do azedume que passei a transportar dentro de mim e me tornou numa pessoa certamente pior, mais revoltada e céptica, magoada e decepcionada com um país, uma justiça e uma sociedade implacáveis. Tudo isso agravado com a simultaneidade de neste entretanto ainda ter sido declarado insolvente, eu e a minha ex-mulher, por incumprimentos da Fernão Mendes Pinto dos quais éramos avalistas, sem que nada nem ninguém tivesse querido evitar tal situação, designadamente, quem continua a beneficiar dos porcento de contrapartidas e dos benefícios que dessas operações resultaram, mesmo conhecedores da situação e podendo tê-lo evitado em tempo útil. E com isso perdido casas de habitação e rendimentos, sido forçado a pagar custas de tribunal e a custear a minha defesa, e prejudicado irremediavelmente os meus filhos e ex-cônjuge que, tal como eu, afinal sempre estiveram inocentes.
Finalmente, agradecer sinceramente o profissionalismo, a competência e amizade do meu advogado Dr. Ricardo Cid, também do Dr. Luís Santos, sem os quais tudo teria sido muito mais difícil de enfrentar. Pois nunca esquecerei a forma afável como sempre me trataram e acreditaram na minha inocência, e a paciência que tiveram para me ouvir e tranquilizar. Não poderia ter encontrado melhor!
Para concluir, realçar a actuação do Colectivo de Juízes em geral e do Juiz Presidente em particular, pela clarividência e imparcialidade demonstradas, também pelo rigor e por terem dado uma imagem da justiça que, francamente, quase ninguém tem em Portugal. No meu caso foi feita justiça e ninguém melhor do que eu para dizê-lo, o que não obvia a ignomínia por que passei ou indemniza os custos materiais e imateriais em que incorri!
 
Nisa, 11 de Julho de 2013
 
Victor Camarneiro

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