domingo, 4 de julho de 2010

Eu não sou jornalista


Sou acérrimo defensor da Liberdade de Imprensa, um dos princípios pelos quais um Estado de Direito se deve reger, um dos pilares da Democracia. Os jornalistas, no desempenho das suas funções, têm papel de relevo na denúncia de actos de má governança, dando-os a conhecer ao público.

Em Portugal a conduta dos jornalistas rege-se por um Código Deontológico de 10 pontos, aprovado em 4 de Maio de 1993. Existe ainda o Estatuto do Jornalista (Lei 1/99 de 13 de Janeiro), onde os seus deveres e direitos são descritos. Transcrevo aqui o primeiro artigo do Código Deontológico dos Jornalistas, em minha opinião mais importante que a própria Lei, porque nele os próprios expressam os princípios éticos que devem reger a sua conduta:

"O jornalista deve relatar os factos com rigor e exactidão e interpretá-los com honestidade. Os factos devem ser comprovados, ouvindo as partes com interesses atendíveis no caso. A distinção entre notícia e opinião deve ficar bem clara aos olhos do público."

Sublinhei a negrito as palavras "rigor", "exactidão", "notícia" e "opinião", porque alguns jornalistas, seja por necessidade de protagonismo, má formação ou agenda de algum tipo, embarcaram numa viagem sem retorno, fazendo tábua rasa de todo e qualquer princípio ético, esquecendo-se do seu significado, numa postura obscena que desonra e mancha a classe. Mais grave ainda, alguns fazem-no alegando o direito do público à informação e a busca da verdade.

Manuela Moura Guedes (MMG) está entre o rol dos que praticam este jornalismo execrável. Ao longo de anos, no palco privilegiado que é um jornal numa estação televisiva, ainda que sensacionalista e barata, foi atropelando tudo à sua frente, atirando a tudo o que mexia, sem rigor nem exactidão, e muito menos distinguindo notícia de opinião.

Acima da Liberdade de Imprensa está a Liberdade de Expressão. MMG tem o direito de se expressar como, onde e quando quiser, excepto quando está no desempenho da sua profissão. Aí está obrigada a noticiar e não a opinar, como vimos em muitas ocasiões, de que relembro aqui o espectáculo degradante que foi a entrevista a Marinho Pinto, Bastonário da Ordem dos Advogados.

José Sócrates, Primeiro-Ministro (PM) de Portugal esteve na mira de MMG durante vários meses. Ainda que, e isso ainda está por provar, os "factos" revelados acerca do PM fossem verdade, o modo como foram trazidos a público, num tom jocoso e depreciativo, com dichotes mais ou menos indirectos a pontuar cada reportagem ("pelos vistos José Sócrates, lá no seu alto e com os seus olhos castanhos, tem memória curta", ou "é por estas e por outras anedotas que o nosso país continua a ser muito... especial", MMG dixit), bastariam para transformar o Jornal Nacional num "freak show" e MMG em comediante, ambos prestando um mau serviço público, absurdo e indigno.

José Sócrates disse alto e bom som o que pensava do Jornal Nacional em geral e de MMG em particular. Iam caindo "o Carmo e a Trindade" porque, em Portugal, pelos vistos, um Primeiro-Ministro (ou, para este efeito, qualquer político titular de cargo público), tem que comer e calar! Ou seja: uma jornalista pode emitir opiniões, em local e momento onde o não deveria fazer, mas um Primeiro-Ministro não tem direito a ter opinião e a torná-la pública.

MMG sentiu-se injuriada, apresentou queixa contra o PM por difamação e o Ministério Público instaurou o respectivo processo, que agora deu por encerrado, entendendo não existir matéria para deduzir acusação. Perante isto MMG volta à carga, considerando "interessante" o desfecho do caso, e afirmando que "nos últimos tempos, quando se trata do Primeiro-Ministro a lei tem tantos nós que já não sei." Ou seja, depois de ter levantado suspeitas, que, volto a frisar, ainda estão para ser provadas em sede própria, sobre o PM, deixa agora no ar acusações veladas aos Tribunais e aos juízes, revelando o que parece ser uma especial sanha contra alguns orgãos de soberania e os seus representantes.

Reafirmando que sou acérrimo defensor das Liberdades de Imprensa e Expressão, sou também acérrimo defensor de um jornalismo isento, claro e conciso. Os artigos de opinião, que muito prezo, até porque dou modesto contributo nessa área, têm o seu lugar, importante sem dúvida, desde que fique claro para o público que é disso que se trata. Informação travestida, desvirtuada, jornalistas sem sentido ético, inebriados pela visibilidade e força que têm os media, constituidos em paladinos da verdade, não obrigado.

Isto não é o Jornal Nacional, não sou jornalista e esta é a minha opinião.
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imagem daqui: http://publico.pt

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