
Não sou de ler seja o que for de um só fôlego, nem as notícias do jornal. Leio pausadamente, volto atrás para reler algo, digiro devagar a informação que vou recebendo. Também assim foi com este livro da Margarida.
Antes de iniciar a sua leitura, e pese embora já conhecer a escrita da Margarida, da coluna que manteve no "Jornal de Nisa" durante algum tempo, e de a forma não estar em questão, preocupava-me o conteúdo. Com a brutalidade própria da franqueza, e não sei ser de outro modo, digo-vos que receava entrar numa obra piegas e plena de auto-comiseração, o que a situação nela retratada até poderia justificar.
Em vez disso, encontrei um texto lúcido, onde a verdade de um drama real nos é exposta de forma nua e crua, directa.
Como já anteriormente referi, não acompanhei, numa opção consciente e deliberada, o declínio do Pai Jorge. Assim, e até porque nunca busquei pormenores junto da família, tomei agora consciência, de uma só vez, da complexidade desse processo. E lamento hoje nunca ter, por uma vez que fosse, ido junto do Pai Jorge para lhe dar uma abraço. É que, resguardado pelo escudo das minhas convicções acerca da vida e da morte, nunca me ocorreu que nem todos pensamos assim e que, a ele, lhe faria falta esse abraço. E o mesmo vale para a Maria da Luz, o Marco, a Margarida, o Gustavo, a Catarina e o Tiago, que mais de perto sentiram este drama. Pelo que vale, ele aqui fica, de modo dorido e com um sentido pedido de desculpas pelo atraso.
Voltando ao livro: nunca antes li obra alguma que, na primeira pessoa, relatasse o dia-a-dia de uma família asfixiada por uma situação do foro oncológico. Por norma, famílias nesta situação, começando logo pelo facto de se referirem à doença por meio de eufemismos como "coisa ruim" e afins, quase escondem dos outros o que acontece. Como se o cancro fosse um anátema lançado sobre eles, quase com vergonha.
A Margarida, e pelo que me foi dado ler, a família Oliveira no geral, pegou o touro pelos cornos e lidou com a doença como eu acho que deve ser: de frente, olhos nos olhos, a lutar até ao último suspiro.
Durante a leitura, e passado o tal início receoso, embrenhei-me na história, ri-me em algumas passagens, alto e se calhar escandalosamente, tendo em conta o que nele se retrata, chorei noutras. Não digo que assim seja para todos, mas para mim, que conheci o Pai Jorge e diariamente revejo e cumprimento alguém da família Oliveira, este livro funcionou como uma espécie de catarse, permitiu-me um último adeus ao Pai Jorge, que está no céu, não no das crenças religiosas, em que não acredito, mas no da minha memória, onde guardo a lembrança da gente boa que fui conhecendo e cujo corpo voltou ao pó.
.
Quem quiser adquirir o livro, pode fazê-lo aqui.
1 comentário:
já tinha dito que gostara da atitude. agora redigo-o, razão acrescida.
forte abraço
Enviar um comentário