No passado sábado, dia 9 de Abril, tive o prazer de servir de motorista ao grupo de Peregrinos (Pimpão, Sérgio, Castro, Leonel, Delfino e Alexandre) que nesse mesmo dia deu início, com partida da Sé Catedral do Porto, a mais uma peregrinação a Santiago de Compostela.
Estando inicialmente previsto que a viatura que transportaria seria a da INIJOVEM, por avaria desta, decorreu a viagem na viatura, pronta e gentilmente cedida, do Sport Nisa e Benfica, digna e vetusta associação deste concelho.
Logo na auto-estrada, e em crescendo à medida que nos aproximávamos do Porto, começaram as buzinadelas das viaturas que por nós iam passando. Eu, que conduzia e me concentrava na estrada, não pude ver, mas os companheiros de viagem iam comentando que tanto recebiam polegares para cima, de aprovação e simpatia, como dedos médios distendidos e os dedos indicador e anelar dobrados. Em simultâneo, íamos ouvindo gritos de "Benfica" que alternavam com "Mouro", "f.. da.. p...", "ca..ões" e afins.
Chegados ao Porto, a coisa continuou mais ou menos no mesmo tom, com a viatura a despertar imensa curiosidade. Exceptuando algumas "bocas" mais "foleiras" e insultuosas, aqui e ali com alguns comentários bem humorados, nada de especial se passou. Até ao momento em que iniciávamos o regresso a Nisa: de uma viatura que connosco se cruzou, logo à saída da Sé, a baixa velocidade, depois de uma torrente de impropérios, saiu cuspidela em direcção à nossa viatura. Em direcção à viatura, vírgula: em direcção a mim, e que só não me atingiu, e de que, aliás, não me teria dado conta se não fosse quem ainda me acompanhava, porque deixei descair a viatura um par de metros e atingiu esta no janela do banco intermédio.
Durante boa parte da manhã a viatura transportou nesse dia 9 pessoas, das quais, se a memória não me atraiçoa, uma, eu, não tem preferência clubística, outro, o Alexandre, brasileiro, "torce" noutro campeonato, 2 são adeptos do Porto, 2 do Sporting e 3 do Benfica. Embora o futebol seja tema recorrente nas nossas conversas, nunca em momento algum, deixamos que essa temática interferisse na nossa sólida e genuína amizade. Á vez, consoante os resultados da jornada que decorre, cada um vai ouvindo umas piadas, uns mais do que outros, que não há quem sempre ganhe nem quem nunca perca, que encaixa com bom humor e sem acinte.
Conto esta história não porque tenha ficado com algum rancor aos adeptos do Futebol Clube do Porto ou à cidade do Porto, longe disso! Não sou idiota a ponto de tomar a nuvem por Juno e confundir alguns, em abono da verdade, poucos, energúmenos, com a esmagadora maioria dos portistas e portuenses. Aliás, esta história poderia ser a mesma se eu conduzisse uma viatura com símbolos do FCP em Lisboa ou do Sporting Clube de Braga em Guimarães. Conto esta história porque me custa a aceitar toda esta raiva, cega e indiferenciada, que perante o símbolo de um clube rival, leva algumas pessoas a perder toda a civilidade e boa educação. A cegueira era tanta que, numa carrinha onde os nomes "Sport Nisa e Benfica", Nisa e Portalegre são bem legíveis, perante a visão da águia, todo o raciocínio sereno cessava. Estou aliás piamente convencido que se a viatura tivesse emblema a vermelho, com uma águia de asas abertas e os dizeres "Associação Ambiental para a Protecção da Águia Pesqueira", o resultado seria exactamente o mesmo.
Estive quase a escrever, no parágrafo anterior, "me custa a entender", mas emendei a mão: entender, eu entendo. O jogo da bola, uma coisa simples e divertida, que deveria dar prazer a quem a ele assiste, transformou-se, muito por culpa de sucessivas direcções de clubes e da FPF, treinadores, jogadores e até políticos, em vil negócio ou em bandeira regional, numa atitude mesquinha e provinciana. Claques violentas, comandadas por gente de duvidosa vida, que de futebol deve gostar muito pouco, ou não passaria jogos inteiros de costas voltadas para o campo, enquanto coordena os seus apaniguados ou invectiva a claque adversária, que existem com a complacência, quando não colaboração, dos clubes, só ajudam a este estado de coisas. Gente que é regularmente detida pelas autoridades e de novo posta na rua pelos tribunais, regressando aos estádios na maior das impunidades.
Quando se torna necessária a intervenção do Ministro da Administração Interna, quando as estradas deste país têm que ser vigiadas, com agentes da autoridade a acompanhar as caravanas de adeptos e postados em cada passagem superior das auto-estradas ou aos milhares a vigiar jogos, alguma coisa vai muito mal! Quando um pacato cidadão não pode conduzir uma viatura, seja lá com que símbolos for, pelas ruas e estradas deste país sem ser insultado e assediado, alguma coisa vai mal, mesmo muito mal!
Urge alterar, neste particular, a legislação desportiva, e punir com mão severa os clubes, nisto incluindo dirigentes, treinadores, jogadores e adeptos. Urge ainda que os tribunais entendam que estamos perante um cenário de progressiva escalada, com previsível desfecho de irreversível gravidade, e puna os prevaricadores com a severidade que se impõe, banindo dos estádios deste país quem neles não se sabe comportar. Infelizmente, e como a política ainda vai andando de mãos dadas com o futebol, e os políticos e os tribunais não têm tomates para fazer o que deve ser feito, só depois da casa roubada se devem colocar as trancas à porta. Mas neste particular, isto significa que estamos a falar de um desastre em que uma multidão se descontrole (Heysel Stadium, 1985, Estádio Nacional, 1996, lembram-se?) e alguém morra e muitos fiquem feridos até que algo se faça.
Tudo visto e analisado, acho que no meio de toda esta trapalhada, só se safam os apanha-bolas: no final de cada jogo, a recolha de bolas de golfe, telemóveis, isqueiros, moedas e outros pequenos objectos que vão caindo sobre o relvado, ainda é capaz render uns cobres. O que é estranho é que, a última vez que fui a um estádio, na companhia do meu sogro e do meu filho, então com 8 anos, tudo malta com ar arruaceiro e facínora, me revistaram a mochila, obrigaram a tirar a tampa da garrafa de 1,5 lt de água e a abrir os pacotes de sumo que levava e a beber boa parte do seu conteúdo. Mistérios do futebol que não tenho a veleidade de querer entender....
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